sexta-feira, 8 de março de 2013

Trecho: Estória 4


Ela escorregou seus dedos pelas madeixas escuras e apertou-as com pujança e pretensão; ele cheira tão bem, pensou entorpecida, acomodando o moreno entre suas pernas. Vibrações faziam-na suspirar satisfeita, ao mesmo tempo em que uma fome abrasadora exprimia os lábios carnudos e vermelhos contra os dela, sufocando-os em um frenesi desmedido e ansioso. Não era o bastante, tinha de saciar sua vontade — sentia que poderia morrer se não o fizesse.
— Eu preciso de você. — sibilou rouca.
Ele pressionou sua virilha na dela, esfregando-as tortuoso por cima da calça social que vestia. — Você quer isso? — a voz reverberou carregada. — Me quer dentro de você, Eduarda? — Como ele sabia seu nome? Ela não se lembrara de tê-lo dito, assim como ele não tinha dito o seu. Atordoada, desvencilhou-se de qualquer pensamento inoportuno que a trouxesse de volta para o ambiente gélido e hostil do banheiro, ou para as vozes abafadas e contagiantes do outro lado da porta. Sentiu uma fisgada leve no lábio inferior e gemeu; ele ainda esperava sua resposta, as mãos coladas a lateral de suas coxas não se movimentavam para além do vestido de seda, só persistiram em diminutos círculos por toda a extensão de sua carne.
— Alguém pode aparecer e... — tentou formular uma objeção.
O moreno apertou suas coxas, sorrindo sombrio.
Ela pôde analisá-lo mais atentamente; seus olhos eram incríveis orbes opacos e escuros — nada do que vira se comparava aquele par de olhos negros —, a fisionomia dura e cética tentava a ponta de seus dedos, desejava tocar a face angulosa e saliente. Tocou. A pele morena brilhava sob seus dedos, gostava da sensação da barba sobre sua pele — pinicava, arranhava.
— Ninguém vai aparecer. — garantiu, observando-a estreitar os olhos, desconfiada. — Confie em mim. Ninguém entrará, não enquanto nós estivermos aqui.
Não confiava nele.
Mas assentiu.
Escorregou suas mãos para os botões da camisa que ele vestia — eram tão extremamente pequenos... Tão extremamente complicados. Inquieta, esticou os dois lados de sua camisa, e botões escaparam soltos, caindo em um baque surdo no chão de mármore. Havia estragado com sua camisa. Acariciou o peito esguio e tencionado, os músculos contraídos estremeciam com o contato das mãos pequeninas e, por vezes, tímidas. Ele a queria tão ousada quanto ele; regredira naquela busca e, curioso para assistir a reação dela diante a ideia, afastou sua calcinha e penetrou dois dedos dentro de sua intimidade. As unhas lhe arranharam a pele das costas de forma prazerosa, ouviu o balbuciar surpreso de Eduarda escapulir trêmulo e incoerente. Movimentou os dedos dentro dela rápido, beijando e mordendo, ávido, a lateral de seu pescoço.
Ela desabotoou a calça social preta, deslizando-a até o chão. Não podia esperar, não queria esperar. Meu Deus, como desejava senti-lo preenchendo-a, permitir que os peitos se chocassem exultantes... Ouvi-lo chamá-la por entre o êxtase profundo que viviam juntos. Os lustres dispostos tremeluziram — em um segundo apagavam, no seguinte, acendiam. O moreno tirou os dedos melados de dentro dela, escorregando a calcinha pelas pernas de Eduarda. Os cachos loiros e femininos desprendiam-se do rabo que fizera minutos antes, por fim, tamparam o beijo faminto como cortinas douradas.
Ele investiu em seu sexo.
Uma.
Duas.
Três vezes.
Os seios foram expostos, rígidos e intumescidos, acariciados, os lábios tocavam a pele sensível lascivos, experimentando de seu gosto adocicado e suave. As luzes voltaram a piscar, agora, mais intensas e constantes. Eduarda, contudo, não temeu. O calor lhe corroia, vertigens se embaralhavam a um prazer doloroso — quase desagradável. Os movimentos abruptos e bruscos incentivavam-na a tocar no moreno, a feri-lo, a aproximá-lo mais um tanto, mais um tanto, mais um tanto. Não era o bastante. E ainda era a melhor sensação que lhe fora dada.
— Mais... Mais... — repetiu entrecortada.
Ele intensificou as estocadas, e suas mãos se arrastaram lânguidas até a coloração escarlate de suas bochechas. Estudou a fisionomia doce, os traços leves. Uma pontada de arrependimento. Outra. Mas o desejo não permitia que ele parasse. Era bom demais, quente demais, forte demais. Prendeu seus lábios com os dela; sugou-os com volúpia, ah, como é bom... Como é doce.
Um arrepio varreu a pele deles.
Naquele momento, eram só corpo.
Só sensação. Só êxtase.
O beijo abafou a euforia; o moreno gemeu, agarrando-se ao corpo de Eduarda. As luzes se apagaram por um ou dois minutos. Ele tinha sua cabeça descansada na curvatura do pescoço da loira, sentia o seu perfume — baunilha e mel —, desfrutava daquele seu tempo. Nunca quis tanto estar com alguém; nunca tinha gostado tanto de estar com alguém.
 — Como sabe meu nome? — as mãos acariciavam as costas do moreno, desenvolvendo labirintos em espiral.
Ele demorou a lhe responder, tinha a postura rígida. Ainda descansava dentro do calor confortável de Eduarda, e não quis sair de lá. Movimentou seu membro cuidadosamente e escutou o grunhido frágil vindo da loira. Parecia o ronronar de um gato.
Uma gata.
Ela se enroscou em seu corpo.
— Eu sei tudo sobre você. — abafou um riso.
— É? — ele concordou com a cabeça. — E o que mais você sabe...?
Baunilha.
Mel.
Ela o fazia falar.
— Sua cor favorita é o amarelo... — beijou seu pescoço.
— Hum... Nada mal. — sussurrou divertida. — Mais alguma coisa...?
— Você trabalha em uma lanchonete... Perto daqui. — voltou a massagear seus seios, agora, de forma mais branda.
Ela assentiu.
— Qual seu nome? — a pergunta escapuliu trêmula.
Ele não podia falar.
Mas queria.
Ele queria a tudo quando perto dela.
Saiu de dentro do calor úmido que o acomodara tão bem, que o fizera se sentir tão bem. Tinha de parar, embora as mãos de Eduarda o agarrassem enquanto os lábios rubros e inchados lhe pedissem para ficar. — A gente tem que parar. — advertiu atordoado.
— Eu não quero parar... — mordeu os lábios.
Cuidadoso, tampou os seios dela com a parte de cima do vestido. Separou-se abrupto, capturando sua camisa e observando o vestido de cor preta, justo, escorregar pelas pernas de Eduarda, a calcinha se acomodar atrás deste. Ele a queria de novo. Sua garganta ardia, o cheiro dela impregnado em suas roupas só o fazia desejá-la mais.
— Você tem que me prometer uma coisa.  — ele estava sério.
Ela sorriu provocadora.
— Não vou mais te ver?
— Não. — respondeu. — Eduarda, preste atenção.
— Eu quero te ver de novo. — contrapôs teimosa.
Vinícius se aproximou, sua camisa aberta, os botões ainda soltos pelo chão de mármore.
Não confie em você. — sua voz reverberou severa.
— Do que você está falando? — segurou o braço dele.
— Não confie em você. — repetiu. — Eduarda, por favor, me escute.
— Estou escutando! — exclamou. — Está me assustando... — emudeceu.
Seus olhos observaram um brilho incomum alastrar-se pelos orbes antes negros. Era um brilho violeta. Nunca vira nada parecido; azul, rosa, roxo. As três cores se embaralhavam, se completavam. Lindo, e, decerto, assustador.
Ela — a cor — era única.
Fazia Eduarda pensar no nascer do sol; na sensação triste e nostálgica das manhãs de sábado, quando acordava cedo para espiar o dia nascer. Mas aquelas duas bolotas violetas eram mais intensas e incrivelmente mais vivas.
— Seus olhos... — acusou.
O moreno tampou-os por um segundo, e retornaram ao preto opaco.
— Como você fez isso? Seus olhos, eles não... O que você é? — desprendera seus dedos dele.
Temeu.
O desejo foi substituído por um mal estar; Eduarda cambaleou para frente, confusa e desnorteada. Aqueles olhos não eram humanos, não eram normais. E ainda que fossem surpreendentemente atraentes e lindos, continham escuridão. Continham o vazio.
Não piscou, sequer desviou o olhar. Tinha de se afastar... Tinha de sair daquele lugar. Foi andando trôpega até a porta, forçou a maçaneta uma, duas, três vezes. Sentiu-o tocá-la.
Recuou.
— O que fez comigo? — questionou nervosa. — Você fez alguma coisa, não foi? O quê?
— Me desculpa.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Trecho: Estória 4


Luca sentou-se na poltrona de feltro, seus olhos examinavam Violeta. O quarto acomodava o breu. As janelas tinham sido fechadas, a porta levemente entreaberta trazia um vento gélido e pouco reconfortante. Violeta se mexeu. Os cabelos curtos encostaram-se à face suada, causando-lhe um exaspero incomum. Luca levantou, prevendo a euforia de Violeta, as mãos da mesma se tocavam a procura de conforto, bagunçavam seus cabelos, apertavam suas pálpebras. Ela lutava para despertar, e Luca foi até sua cama e segurou seus braços, obrigando-a relaxar. Ele não previu o grito exasperado que ela soltara em seguida, carregava dor. Balançou seus ombros, tocou em seus cabelos. Mas ela sequer o chamou. Seus braços lutaram vorazes para se desprenderem dele, enquanto suas unhas imputavam dor em si mesma, vincando-se sádicas em sua carne.
— Violeta, pare! — chamou assustado. — Porra, acorda! O que você está fazendo? — ela estava sangrando; as unhas haviam conseguido perfurar a pele de suas mãos.
Ele soltou-a aturdido e observou Violeta arranhar seus braços, seu rosto. A imagem fora tão assustadora que ele arfou, buscou por algum juízo dentro das frases abafadas dela, mas ouvia somente o desespero, a ânsia, o nojo de estar sendo tocada por ele. A mente dela trabalhava em um cenário obscuro, macabro e caótico. Dor. Dor. Dor. Sua pele queimava. Sua garganta ardia. Luca, ela precisava de Luca. Precisava daquele calor, do aconchego de seus braços, de seu silêncio. Alguém gritava dentro de sua cabeça; alguém a machucava. Mas quem? Onde ela estava? Gritou ao experimentar das mãos desconhecidas desferindo tapas em sua face, tapas que lhe trariam marcas. Agora ele a tocava nos braços, dizia para parar. Parar com o quê? O que ela tinha feito? Debateu-se, impedindo que seu agressor voltasse a feri-la. Ela tinha de encontrar um jeito de seu comunicar com Luca. Ele sabia que ela corria perigo? Suas pernas se contorceram, desprendendo-se da do homem em cima dela. Pediu por socorro. As casas vizinhas talvez a ouvissem, embora ela estivesse com portas e janelas trancadas. Rugiu.
— Violeta, pare! — a voz lhe disse de novo. — Me escuta! Acorde!
Acorde.
Forçou seus olhos e encontrou um par de orbes negro.
Luca.
As costas dele curvaram-se exaustas, mas suas mãos ainda mantinham-se em volta dos braços dela. Ele tinha de ter certeza que Violeta não voltaria a se machucar, não suportaria vê-la se contorcendo na agonia que ela própria causava a si.
Lágrimas.
Ela estava chorando. 

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Trecho: Nina no país dos livros


Nina gemeu inconsciente.
— Ei, garota, acorda. — chamou alguém.
Ela recebeu suaves tapinhas nas bochechas.
Virou para o outro lado, ela estava deitada em alguma coisa dura e desconfortável, enquanto seu casaco esquentava seus pés. Ela queria acreditar que tinha voltado para casa, que aquilo tudo não havia passado de um sonho maluco, mas a voz lhe era familiar e o cheiro de pão fresco preenchia o ar como na noite anterior. Ela ainda estava naquele pesadelo. Só um sonho, só um sonho!
Abriu ligeiramente um dos olhos e topou com o vazio. Estava virada para uma parede suja e úmida. A claridade batia de encontro a ela, incomodando seus olhos. A mão novamente tocou sua pele, só que agora mais impaciente. Sua mão serviu como proteção a iluminação intensa e mirou à imagem esguia e mal humorada do garoto que conhecera tarde passada. Ele estava com outro livro na mão, quase na metade de um exemplar de Shakespeare. Suspirou melancólica, pondo-se de pé quase que imediatamente.
— O que você quer comigo? — indagou agressiva.
Ele deu de ombros, visivelmente confuso.
— Não preciso da sua ajuda! Afogue-se em seus livros e me deixe em paz.
Marchou para longe dele, suas mãos agarravam o casaco com força. O barulho vindo do comércio abafava os chamados de... Qual era o nome dele mesmo? Ela tinha perguntado, ele tinha dito? Não desistiu de suas pisadas violentas no chão de terra. Que horas seria? Em que parte da cidade estaria? Quanto tinha andado desde ontem? Seu celular estava sem sinal. Nenhum de seus aparelhos eletrônicos funcionava. Suas roupas lhe deixavam com calor. Estava a ponto de gritar consigo mesma, quando uma mão alcançou seus braços.
Era ele, nem era necessário voltar-se para trás.
Suas mãos não mais carregavam a obra de Shakespeare, sua cabeleira ruiva estava bagunçada. Ficou esperando o que ele tinha a dizer, mas ao invés disso, ele lhe estendeu um pão. Só de olhar para a casca dourada, dura e suculenta sua boca salivou. Quis esconder essa urgência, mas o estômago a enganou. Estava sem comer a tanto tempo que podiam lhe servir uma pedra com molho de tomate e ela devoraria feliz. Ele aproximou o pão dela, sorrindo forçado. As covinhas surgiram tímidas pelo canto de seus lábios.
Até que ele era bonito.
Não o bastante para atraí-la, é claro. Mas gostava de seus traços rígidos e o formato triangular de seu rosto. As bochechas proeminentes, o queixo fino, a testa larga. Seus olhos amendoados e grandes piscavam ansiosos, enquanto os cabelos vermelhos balançavam disformes, caiam pela sua testa, escondendo ligeiramente seus olhos. Uma cicatriz longa e profunda se arrastava pela pele alva, um pouco abaixo da mandíbula. Desviou o olhar, constrangida. Havia passado tempo demais o encarando. Apanhou o pão das mãos dele, sem tocar em sua pele, e mordeu um pedaço do alimento cheiroso e quente. Estava uma delícia! Continuou a comê-lo, a fome era voraz, o desejo de devorar  aquele pão em instantes lhe era sufocante, mas tinha medo de que lhe acabasse.
— Desculpe se fui grosseiro ontem. Não foi minha intenção. — desculpou-se na defensiva. — Mas você também tem sua parcela de culpa. Andar de costas não é lá o modo mais esperto de se locomover. — soou irônico.
Nina mastigou irritada.
— Eu estou perdida! — alegou. — Quero voltar para casa.
— Você se perdeu? — perguntou divertido. — Diga-me que está de brincadeira.
Ela negou.
Estava tão exausta — seus músculos doíam, seu estômago doía, sua voz saia rouca e entrecortada. Nada estava certo. Longe de sua casa, longe de seu conforto, longe de tudo que lhe fazia feliz. Apertou as mãos em punhos, assustada com o que via. Era livro demais, mais do que ela vira em toda sua vida. Eles descansavam por todos os lugares. Nunca se sentira tão apavorada.
— Olha, eu posso te ajudar a procurar pela sua casa. — ponderou.
— Já disse, não quero sua ajuda! Você é um idiota, sabia? — encolheu-se, esbarrando em uma mulher que carregava uma criança no colo.
— Você é bem inconveniente, minha linda.
— Não sou sua linda! — afastou-se dele, ouvindo-o gargalhar à distância.

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